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18 de Abril de 2024

Reintegração / Manutenção de Posse - Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa - Procedimentos Especiais - Número: 0072662-32.1996.4.02.5101

há 6 anos

Ilmo. Senhores temos na Cidade Universitária um processo de reintegração de posse movida pela UFRJ em 1996, contra oito famílias que moram ali antes da unificação das ilhas do arquipélago de Inhaúma na Baia de Guanabara, para construção da Universidade do Brasil, hoje UFRJ, quero dizer que minha família mora ali desde 1931. Quando começou a unificação das ilhas para a construção da mesma em 1950 , meus familiares foram remanejados da Ilha de Sapucaia para a Ilha de Bom Jesus , também pertencente ao arquipélago, hoje o processo teve um fim! Que todos saiam das nossas casas sem direito a nada.

Algumas considerações a respeito do Mandado de Reintegração de Posse expedido em 06/10/2017 pela Justiça Federal.

Deveriam levar em consideração o Estatuto do Idoso Lei 10741/03, sendo sabido que existem pessoas com idade acima de sessenta anos, deveriam também levar em consideração o Estatuto da Criança e do Adolescente lei 8.069 de 13 de Julho de 1990, sabendo que ali existem crianças, inclusive com menos de um ano e dois meses.

As/os moradoras/es daquela área habitam aquele espaço antes mesmo do aterro que uniu as nove ilhas e criou a configuração territorial que hoje existe. Habitam, portanto, aquele espaço antes mesmo da normatização contemporânea sobre o uso da terra urbana existir e, com o passar do tempo, a legislação seguiu a direção de, cada vez mais, garantir a permanência deste tipo de ocupação. É Muito importante que a Universidade Federal do Rio de Janeiro seja capaz de lidar com esta situação de modo a configurar negociação exemplar, no sentido de garantir a permanência de moradores, auxiliando, deste modo, a reforçar direitos conquistados pela Constituição Federal de 1988 que, cada vez mais, têm sido atacados, como todos sabemos.

A lei 13465/2017, proposta e aprovada pelo atual governo, por exemplo, altera diversos aspectos referentes à regularização fundiária na direção de instaurar, na prática, a substituição da função social da propriedade por uma função mercantil da propriedade (urbana e rural), ao considerar o princípio da “eficiência” do uso das terras como norteador das mudanças. Entretanto, a constituição não foi alterada e os artigos 182 e 183 seguem garantindo o princípio da função social. Além disto, permanece válida a Medida Provisória 2220/2001 (que foi lançada junto com o Estatuto da Cidade – lei 10257/2001) regulamenta o direito à concessão de uso especial para fins de moradia em terras públicas, que foi retirado do Estatuto alegadamente por ineficácia jurídica da forma como estava originalmente redigida.

Ao mesmo tempo, é importante reforçar que a nova lei 13.465, oriunda da MP 759, propõe diversos instrumentos de facilitação de transmissão de terra pública ao setor privado, constituindo, no caso das universidades, a meu ver, uma perigosa ameaça à nossa autonomia, na direção de permitir, e incentivar, que as terras das instituições de ensino tornem-se recursos geradores de (auto) financiamento da universidade, rompendo com a autonomia de gestão de seu patrimônio e direcionando o uso da terra da universidade para fins mercantis. É o que ocorre, por exemplo, com a Fundação Jardim Botânico que, ao ter seu estatuto alterado na década de 90, torna-se “auto-sustentável” e começar a depender de geração de renda para seu funcionamento, afetando seu funcionamento e gerando, inclusive, conflitos intensos com moradoras/es históricos que lá habitam há décadas, trabalhando e cuidando daquele espaço e começam a ser vistos como uma ameaça, na medida em que ocupam terra que pode ser geradora de renda (há teses e dissertações que abordam este caso, defendidas na própria Autarquia, e que podem ajudar a esclarecer esta relação com dados históricos mais precisos).

Paralelamente a isto, vivenciamos nos últimos anos no Brasil, com destaque para o Rio de Janeiro, um ataque ao direito à moradia das populações pobres com a retomada da política de remoções, amplificada à escala contemporânea que, em números absolutos, superou a quantidade de remoções realizadas por Pereira Passos e Carlos Lacerda segundo levantamento de Lucas Faulhaber. Além de não respeitar as próprias legislações, acúmulos históricos e procedimentos nacionais e internacionais, esta política, que foi reforçada com a edição do Programa Minha Casa/Minha Vida, acabou por retroceder, também, em relação ao entendimento do sentido do que é o direito à moradia. A política de remoção conjugada com a realocação em conjunto habitacional do MCMV, além de ampliar a especulação imobiliária, retirava destas populações, mais uma vez, a condição de permanência que encontravam em seus locais originais de moradia, pois os conjuntos habitacionais, localizados majoritariamente em terrenos bastante distantes de quaisquer centros da cidade do Rio de Janeiro, configuravam-se em locais de despejo providos, quando muto, de mínimas condições físicas de um apartamento, desprovido de: transporte, serviços públicos, condições de trabalho, etc.

Estes dois elementos se juntam no caso em tela. É necessário compreender a maneira como a UFRJ trabalhou na direção de regularização daquelas/es que ocupavam os espaços considerados públicos, para que seja reconfigurado um modo de tratamento a estes e outros casos.

Num momento em que inúmeros ataques seguem ocorrendo, seria desastroso que a Universidade Federal do Rio de Janeiro realize remoção de moradias em seu espaço. Seguem abaixo algumas justificativas para a não realização desta ação que, a meu ver, indicam que deve ser construída, com EXTREMA URGÊNCIA, novo canal de negociação com a justiça, com os moradores e com a comunidade universitária para que a solução possa ser encontrada de maneira justa:

a – As terras públicas estão cumprindo sua função social ao garantirem a permanência de espaços de moradia, sobretudo aqueles anteriores à sua implementações, ou que foram/são oriundos de relação permanente com a comunidade universitária ao longo da história;

b – A UFRJ resolver este tipo de caso sinalizaria para diversas outras situações similares no país um modo possível de solução que desconsidere a remoção como possibilidade, posto que remover moradia de quem não trabalha com a terra como se fosse mercadoria, mas ali habita, sempre será um gesto de injustiça social;

c – O fato da área em questão possuir pequenos núcleos de exploração comercial de subsistência não pode ser entendido como exploração comercial da terra pública. A garantia de moradia, segundo a própria ONU, pressupõe condições de trabalho e, no caso destas condições já estarem dadas, seria um erro retirá-las. É necessário, a meu ver, manter as moradias e o trabalho naquele lugar. Caso haja necessidade de regular a forma de trabalho, caso se perceba que aquele trabalho está se beneficiando da universidade para seu uso privado, por exemplo, apropriando-se da terra como um ativo para impulsionar seu ganho, isto deverá ser enfrentado e regulamentado, mas não pode servir de justificativa para remover aquelas/es que ali habitam;

d – O aumento da privatização da universidade, através da expansão do Parque Tecnológico, por exemplo, deve ser combatido. Reconhecer a moradia como um fim social, incluindo aí o acesso ao trabalho tradicional ali existente, ajudaria a definir o tipo de utilização do espaço do campus a universidade tolerará. Caso se remova moradia enquanto se permite a expansão do Parque, estaremos caminhando, a passos largos, a regulamentar a autorização do uso da terra da universidade exclusivamente se ele servir de “recursos financeiro” para a instituição, justificando o discurso daqueles/as que desejam acabar com a nossa autonomia;

e – Mesmo que seja necessária a remoção, isto é, caso a UFRJ possua interesse imediato, ou futuro, de utilização daquele espaço hoje ocupado pelas/os moradoras/es, esta não pode ocorrer de forma sumária. É necessário negociar com as/os moradoras/es antes de agir, realizar um projeto de transferência negociado e acordado e, principalmente, realizá-lo ANTES da remoção acontecer, como é indicado pelos tratados internacionais assinados pelo Brasil.

Sugiro que seja pensado, com urgência, meios de evitar a reintegração de posse emitida, e seja criada uma comissão para resolver este tema reunindo: reitoria da universidade, moradores do “mangue”, moradores da Vila Residencial, estudantes (com representação do alojamento), técnicos e docentes que renham atuação nesta área (FAU, FND, IPPUR, NEPP - DH, etc).

moravam desde 1931 também pertencentes ao arquipélago, para construção da Universidade do Brasil, hoje UFRJ

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